Claudio Tafla, presidente da Asap (Aliança para a Saúde Populacional)
Ah! Mas na saúde é diferente… E segundo André Carneiro, em seu texto: Os desafios da gestão e do marketing hospitalar, deve ser mesmo.
“Muito provavelmente, boa parte desses desafios, que torna o hospital uma organização complexa em termos de governança, são de ordem externa, conectada no seu relacionamento com SUS e Operadoras de Planos de Saúde, Organismos de Classe Profissionais, Agências Reguladoras e Clientes, sendo estes últimos a razão de ser do hospital, assim como de qualquer organização. Além disso, tem o fato dos prestadores de saúde venderem serviços, com suas margens lícitas, e esses servirem para a manutenção da vida humana. Sabe-se que a indústria de serviços é muito mais complicada de se administrar do que a indústria de bens, pois, organizações que vendem serviços lidam com alguns desafios não encontrados na manufatura, tais como:
1) Intangibilidade: os serviços não possuem características físicas, não podem ser tocados e quem o compra não detém posse sobre ele;
2) Inseparabilidade: os serviços são produzidos e entregues na mesma hora, diferentemente da manufatura, onde um produto é testado antes de ser colocado à venda, no serviço existe menor tolerância ao erro, visto que não há teste;
3) Variabilidade: os serviços são prestados por pessoas diferentes dentro de uma mesma organização e por mais que esta tente padronizar processos com o intuito de buscar um modelo único, torna-se impossível não haver variação entre uma pessoa e outra; e
4) Perecibilidade: os serviços se “estragam” mais rápido do que muitos produtos altamente perecíveis. Não se pode “estocar” um serviço, e nem utilizar a demanda não utilizada no dia anterior. Leitos não utilizados hoje, não poderão ser utilizados de forma compensatória amanhã.”
E sem contar os avanços e incorporações tecnológicas, tão necessários para o sistema de saúde, de onde me vem a constatação de Sir Cyril Chantler, nefrologista pediátrico britânico: “A Medicina costumava ser simples, inefetiva e relativamente segura. Agora ela é complexa, efetiva e potencialmente perigosa.”
Porque nas suas faculdades, os profissionais de saúde aprendem, à exaustão, como fazer Eficácia (em resumo, vencer a batalha contra a doença e “evitar” a morte, pelo maior tempo possível), mas não se ensina Eficiência (em resumo, Eficácia com o melhor – não o menor, nem o maior – dispêndio de recursos possível, quer sejam humanos, quer sejam financeiros).
Por isso é que precisamos de governança corporativa também dentro da saúde, alinhado ao que já dizia, em 1997, o próprio NHS (Sistema de saúde do Reino Unido) na Governança Clínica (“é um sistema através do qual as organizações são responsáveis por melhorar continuamente a qualidade dos seus serviços e a garantia de elevados padrões de atendimento, criando um ambiente de excelência de cuidados clínicos”), dentro de políticas econômicas, sociais e técnico-científicas que sejam decididas por toda a sociedade.
Em uma publicação de Veeenstra et al (2017), revisando 72 publicações, em revistas de alto impacto, identificamos alguns fatores que foram importantes para a implementação exitosa de estratégias de Governança Clínica, caso esteja em processo de implantação:
1. iniciar o processo de baixo para cima para envolver todo o staff;
2. implantar um bom trabalho de grupo com diferentes profissionais, compartilhando responsabilidades, pois leva a um maior engajamento;
3. bons líderes, empáticos e proativos, que garantam o desenvolvimento da força de trabalho:
4. comunicação exaustiva e muito clara, compartilhando os valores e as experiências de uma prática clínica baseada em valor.
Atualmente, este conceito de Governança Clínica está diretamente ligado à geração de valor em saúde, a fim de que as incertezas diminuam e o processo decisório seja mais acertado, pois o que na época da proposta da NHS, revolucionou o modelo de assistência em saúde, trazendo a decisão clínica para o ambiente gerencial e organizacional, hoje, deve aumentar a qualidade dos cuidados e colocar o paciente e sua família no centro de seu tratamento, no conceito de valor em saúde (relação entre desfecho clínico, com qualidade e resultados, e o custo necessário para atingi-los), com a inserção do paciente no centro dos cuidados, em toda sua jornada de vida, com os melhores resultados possíveis, evitando desperdícios e entregando qualidade assistencial.
Fonte: Jornal de Brasília